Em
sua coluna do site ConJur (Consultor Jurídico), o Advogado
Tributarista Raul Haidar escreveu um excelente texto, em que ele
mostra que a carga tributária abusiva no Brasil só será derrotada
se o mau uso do dinheiro público for combatido:
“JUSTIÇA
TRIBUTÁRIA
Arrecadar, administrar, fiscalizar e jogar no lixo
Pregamos
há tempos a necessidade de uma reforma tributária onde se procure
fazer de fato uma Justiça Tributária. Com a atual parafernália que
temos vivemos num inferno fiscal cada vez mais difícil de suportar.
O
leitor atento já terá visto aqui como é esse inferno: carga
tributária insuportável, burocracia esquizofrênica e uma
administração fazendária que despreza as regras básicas da
Constituição, infringindo reiteradamente todas as leis em vigor.
Tudo
isso é um arsenal que tem o objetivo claro de violar os direitos do
cidadão, quando na mão de funcionários que agem fingindo ignorar
que são nossos servidores. Uma terrível agravante: não são
ignorantes, são bem preparados e aparelhados, são inteligentes, mas
nem por isso melhores que o mais simples cidadão.
Esta
é uma república e como tal, somos todos iguais. Em uma entrevista,
quando ainda na ativa como ministro do STF, Eros Roberto Grau
afirmou: “Meu ofício não é mais importante que o do jardineiro
ou daquele que cuida da saúde das pessoas.”
Em
mais de uma oportunidade os governos anteriores encaminharam ao
congresso projetos de uma suposta reforma. Em nenhum momento,
porém, desejavam mudar alguma coisa, pois as propostas além de
pífias não foram submetidas a qualquer debate sério.
Tive
o desprazer de perder meu tempo quando, por indicação da OAB-SP,
estive numa reunião que pretendia debater um suposto projeto sobre
isso. Quem lá estava, presidindo os trabalhos, era um deputado
governista que logo no início afirmou que o governo estava disposto
a discutir qualquer coisa, menos a carga tributária.
Distribuíram material de consulta, discutiram algumas questões sem
relevância e agendaram nova reunião. Nunca mais voltei àquele
local. Aquilo se tornara um debate dogmático, sem futuro e a OAB-SP
não poderia, pelo menos representada por mim, participar de farsas.
Tem
sido divulgada, recentemente, notícia segundo a qual há propostas
de reforma tributária no Congresso. Fiz pesquisa sobre o assunto,
mas não encontrei nada que mereça esse nome. Há apenas projetos
esparsos e que alguém já chamou de reforma fatiada, como se fosse
uma picanha. Tem se divulgado que a reforma tributária não sai
porque depende de emendas constitucionais, sujeitas a quorum especial
de votação e que isso é muito difícil.
Nos
governos de Dilma e Lula (de 2003 a 2012) foram aprovadas 32
emendas constitucionais, a mais recente a de número 71 em 29 de
novembro de 2012. Considerando os resultados eleitorais e as
pesquisas de opinião, o atual governo não teria dificuldade em
aprovar qualquer coisa no congresso atual, onde dispõe de bancada
governista que não parece disposta a tornar-se oposição. Mas o
contribuinte não quer uma coisa qualquer, especialmente um
Frankenstein rotulado de reforma fatiada seja lá do que for.
Foi
emblemática a afirmação do deputado governista que advertiu a
todos naquela reunião onde iria ser discutida uma reforma do sistema
tributário, desde que não se falasse em cortar imposto. Até então
eu pensava que o sistema tributário se resumia em arrecadar,
administrar e fiscalizar. Já aprendi um pouco mais: tem que fazer
tudo isso e tem, ainda, que JOGAR O IMPOSTO FORA !
Isso
mesmo: com todas as carências que o país possui, mesmo que a carga
tributária cresça indefinidamente, não será suficiente. Temos
hoje uma carga de cerca de 37% do PIB. Alguém vai falar que é 35,8,
outro vai dizer que é 36,4% . Todos esses números são
importantes, porque o menor de todos eles, por mais otimista que seja
o avaliador, ainda que diga que são os 20% que seriam o ideal para
um pais que se diz emergente, ainda assim seria muito!
Mais
do que ter recursos (dinheiro, patrimônio,etc.) é saber o que fazer
com eles. Quem tem muito dinheiro pode usá-lo em besteiras,
pois será o único prejudicado , eventualmente incluídos seus
dependentes. Aliás, nesse caso os dependentes podem interditar o
pródigo.
Mas
o poder público só administra recursos alheios. Numa democracia, o
faz por tempo determinado e sujeito a penalidades se usar de forma
indevida o que é do povo ou devia ser, mas alguns pensam que não é.
O
executivo é apenas quem tem a chave do cofre. Está sujeito a
fiscalização do legislativo e este tem como auxiliares os tribunais
de contas. Infelizmente, a corrupção e o nepotismo podem
transformar boa parte da fiscalização em estórias da carochinha ou
mesmo contos do vigário.
Não
vamos gastar o tempo do leitor com situações que são públicas e
notórias e que boa parte da imprensa divulga, mesmo colocando em
risco verbas publicitárias, o que faz com que essa boa parte se
torne melhor ainda.
Falemos
apenas de três casos mais recentes:
Veja-se
o caso de Fortaleza: R$ 650 mil de cachê de artista para um show de
inauguração de um hospital. Isso tem nome: jogar imposto no lixo!
O
mau exemplo de São Paulo: o novo prefeito vai construir vários
armazéns em local privilegiado para servir de espaço a ser
utilizado por escolas de samba. Isso tem nome: jogar imposto no lixo!
No
Estado do Rio de Janeiro: há dois anos o governo disponibilizou
verbas substanciais para atender as vítimas da catástrofe de Angra
dos Reis. O dinheiro praticamente não foi usado, fizeram-se apenas
pequenas proteções em algumas encostas. Isso também tem nome:
jogar imposto no lixo!
O
legislativo deve fiscalizar o executivo. Se não o faz, deve o povo
organizar-se e tratar de exercer essa fiscalização. Já existem
algumas ONGs que procuram suprir essa carência. Eis aí um caminho,
que corre o risco de abrir espaço para os aproveitadores de sempre.
Raul
Haidar é
jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de
Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da
revista ConJur.”
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